domingo, 9 de setembro de 2007

RESENHA

A revisão da bibliografia” em teses e dissertações: meus tipos inesquecíveis – o retorno, In: A bússola do escrever – desafios e estratégias na orientação de teses e dissertações. Alda Judith Alves Mazzotti. Florianópolis/São Paulo: Editora da UFSC/Cortez Editora, 2002.


Resenhado por Patrícia Ferreira Bianchini Borges (Pós-graduanda em Estudos
Lingüísticos: “Fundamentos para o Ensino e Pesquisa” pela UFU – MG)


Este artigo de Alda Judith Alves-Mazzotti, professora coordenadora do Mestrado em Educação da Universidade Estácio de Sá no Rio de Janeiro, foi publicado pela primeira vez em 1992. Muito adequadamente abre, atualmente, a coletânea apresentada na obra “A bússola do escrever – desafios e estratégias na orientação de teses e dissertações”, de forma criativa e bem humorada pondera sobre o papel da revisão bibliográfica em trabalhos de pesquisa, assunto difícil de se tratar e/ou ensinar. O referido texto, segundo Alves-Mazzotti, analisa o papel da revisão bibliográfica em trabalhos de pesquisa por meio do apontamento das principais deficiências, no que se refere a esse aspecto, observadas em dissertações de mestrado e teses de doutorado. Dividido em cinco partes para facilitar a abordagem do assunto, destina-se não só a mestrandos e doutorandos, como a quaisquer interessados em pesquisas uma vez que trata da revisão bibliográfica em trabalhos destinados a esse fim. Na introdução, a autora aborda a problemática ocasionada pelo fato de a revisão bibliográfica, apesar de importante, ser freqüentemente um dos aspectos mais fracos de teses e dissertações em Educação. Observando que a má qualidade da revisão da literatura compromete todo o estudo, discute as dificuldades enfrentadas por pesquisadores iniciantes no que se refere à revisão da literatura necessária e sugere procedimentos que podem contribuir para a elevação da qualidade desses trabalhos. Tratando da contextualização do problema, considera que a proposição adequada de um problema de pesquisa exige que o pesquisador se situe nesse processo, analisando criticamente o estado atual de sua área de interesse comparando e contrastando abordagens teórico-metodológicas avaliando sua confiabilidade, identificando pontos de consenso e controvérsias a serem esclarecidas e tornando-o, por conseguinte, capaz de problematizar um tema, indicando a contribuição que seu estudo pretende trazer. Posteriormente, afirma ser essencial a análise do referencial teórico para clarificar o racional da pesquisa, uma vez que orienta a definição de categorias e constructos relevantes, dando suporte às relações antecipadas nas hipóteses, constituindo o principal instrumento para a interpretação dos resultados da pesquisa. Após teorizar com competência sobre o tema, desfila, caricaturando, os tipos mais comuns de revisão a serem evitados: o summa, o arqueológico, o patchwork, o suspense, o rococó, o caderno B, o coquetel teórico, o apêndice inútil, o monástico, o cronista social, o colonizado versus xenófobo, o off the records e o ventríloquo. Passando às considerações finais, a autora lamenta o destino de grande parte das teses e dissertações: mofar nas prateleiras das bibliotecas universitárias. Aponta como uma das causas para o acontecido, o fato de faltar qualidade nas revisões bibliográficas dos relatórios que apresentam textos repetitivos, rebuscados, desnecessariamente longos ou vazios. Sempre obediente a um critério bastante racional de exposição do tema, recheando o texto de explicações para melhor elucidá-lo, a autora tece comentários críticos que expõem ao potencial leitor a validade de sua leitura. Fala com proficiência desse assunto, que interessa não só a teóricos, bem como a quaisquer produtores de teses e dissertações, ávidos pela aquisição de conhecimentos acerca desta, que é uma área pouco explorada e de extremo valor para todos os setores de pesquisa científica.
ALFABETIZAÇÃO, LINGUÍSTICA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Erika Araújo Uhlemann Corrêa
Patrícia Ferreira Bianchini Borges

A criança, no início da alfabetização tem uma consciência fonológica, que se deturpa quando ela entra na escola e aprende a transformar a fala em escrita, de tal modo que, adulta só será capaz de observar sua fala, sem as interferências da forma gráfica das palavras, após treinamento fonético (CAGLIARI, 1989). Verificamos que alunos do 1º ano do 1º ciclo possuem uma escrita que apresenta essa consciência fonológica, como quando escrevem “camião”, ao invés de caminhão. Já os alunos do 3º ano do Ensino Médio de curso particular, ao tentarem realizar um exercício da apostila, tiveram dificuldades em diferenciar o número de fonemas do número de grafemas de várias palavras, além de apresentarem a mesma escrita das crianças do início da alfabetização ao produzirem textos. Trabalhando com o conceito de que ler e escrever são atos lingüísticos, estimulamos a compreensão da natureza da escrita e da fala, de suas funções e usos sociais, fazendo intervenções que proporcionassem aos nossos alunos compreenderem que falamos diferente de como escrevemos, proporcionando a reflexão em torno dos seus erros ortográficos. Ponderamos que a leitura e a escrita das crianças em fase de alfabetização, é um processo no qual a expressão escrita é influenciada pela fala e suas variações e que o professor mostrando como funciona o português, quais os usos que tem, como fazer para estender ao máximo esses usos nas suas modalidades escrita e oral, em diferentes situações de vida, ensinam aos alunos o que é uma língua, quais propriedades e usos ela realmente tem, qual é o comportamento da sociedade e dos indivíduos com relação aos usos lingüísticos, nas mais variadas situações de sua vida, ensinando adequadamente como elaborar um texto escrito ou dizer um texto oral em situações diferentes, levando os alunos a compreenderem por eles mesmos, como se dá a diversidade da nossa língua, tornando-os competentes ao unirem um significado a um significante, sabendo o que pertence à fala e o que pertence à escrita e por que as coisas são como são, não apresentando dificuldades posteriores em seus estudos de Português. Consideramos que a solução para essas dificuldades pode estar na formação do professor, pois o processo de alfabetização inclui muitos fatores, e quanto mais ciente estiver o professor de como se dá o processo de aquisição do conhecimento, de como o aluno se situa em termos de desenvolvimento emocional, de como vem evoluindo o seu processo de interação social, da natureza da realidade lingüística envolvida no momento em que está acontecendo a alfabetização, mais condições terá de encaminhar agradável e produtivamente o processo de aprendizagem, sem os sofrimentos habituais e sem exigir, a transposição absurda que desrespeita o fenômeno da variação (BAGNO, 2000).

Palavras-chave: alfabetização, linguística, formação de professores.

Referências bibliográficas:
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e lingüística. São Paulo: Scipione, 1989.
BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: edições Loyola, 2000.

* Pôster apresentado no XIII Congresso Regional de Educadores de Uberaba e Triângulo Mineiro em 01/08/2007.
RESENHA COMPARATIVA

por Patrícia Ferreira Bianchini Borges

O presente trabalho trata-se de uma resenha comparativa realizada a partir do capítulo 1 - Oralidade e letramento do livro “Da fala para a escrita: atividades de retextualização”, escrito pelo pesquisador Luiz Antônio Marcuschi, e da obra “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz”, do reconhecido lingüista Marcos Bagno. O objetivo deste trabalho é identificar o posicionamento dos referidos autores no que diz respeito aos mitos relativos ao preconceito lingüístico, assim como aos fenômenos que se dão no contínuo escrita – fala.A partir de um breve histórico das linhas teóricas que tratam o oral por oposição ao escrito e das concepções que pretendem denotar a superioridade de uma modalidade sobre a outra, sobretudo da escrita em relação à fala; Marcuschi, em seu texto, reconhece a importância das contribuições recentes no campo da linguagem e deixa claro seu compromisso sociointeracionista apresentando o campo entre o oral e o escrito como um contínuo complexo que, apesar de apresentar distinções marcantes, paradoxalmente, não se constitui na forma de dois sistemas ou dois pólos estanques. Através de uma reflexão detalhada sobre alguns aspectos do uso da língua, Bagno, em sua obra, conduz o leitor a questionamentos e análises acerca do preconceito lingüístico resultante de um embate histórico entre língua e gramática normativa. Assim, no primeiro capítulo, partindo do pressuposto de que há uma mitologia do preconceito lingüístico, o autor enumera oito mitos que refletem o comportamento da sociedade no que diz respeito ao uso da língua, às suas variantes e principalmente à atitude dos falantes com relação ao seu próprio idioma. O primeiro mito diz respeito à "surpreendente unidade que possui a língua portuguesa falada no Brasil". A caracterização desse mito, como sendo um dos mais maiores e mais sérios, decorre do fato de que, estando tal idéia arraigada à cultura e não reconhecendo como legítima a existência da variação lingüística, a educação seria amplamente prejudicada uma vez que não se reconhecendo a diversidade do português falado no Brasil, desconsiderar-se-iam também os problemas de comunicação entre falantes de diferentes variedades da língua. Segundo Bagno, no Brasil, embora a língua falada pela grande maioria da população seja o português, sua forma apresenta alto grau de diversidade e variabilidade. Marcuschi evidencia compartilhar de tal posicionamento ao afirmar que oralidade e escrita permitem a construção de textos coesos e coerentes, embora sejam permeadas por variações estilísticas, sociais, dialetais e assim por diante. O segundo mito traça considerações sobre o conceito de que o "Brasileiro não sabe português e que só em Portugal se fala bem português", levantando a questão da diferença existente entre língua falada e língua escrita. Num segundo momento, aborda as noções de certo e errado, levando-se em conta o que é natural no uso da língua materna. O autor assegura, inclusive, que a existência desse mito também prejudica o ensino de língua estrangeira. De acordo com Bagno, a sociedade brasileira carrega um sentimento de inferioridade e preconceito com relação a sua língua. Assim, há uma concepção errônea de que os brasileiros não sabem o português, e que a forma “correta” seria a falada em Portugal. Como Bagno, acreditamos que esses estereótipos precisam ser discutidos e esclarecidos, para que nossa nação tenha não somente a independência lingüística, como também a cultural. O preconceito inerente à própria cultura do povo torna-se evidente, quando é enumerado o terceiro mito: "Português é muito difícil". Neste caso, é abordada a questão da existência de uma gramática brasileira e de seu emprego na língua falada, contrapondo-se a uma gramática normativa de origem portuguesa. Segundo Bagno, a utilização da norma culta é privilégio de poucos, e com isso é mantido o “status quo” das classes privilegiadas.O autor justifica a existência do quarto mito, "As pessoas sem instrução falam tudo errado", através da manutenção de crenças decorrentes da triangulação entre escola/gramática/dicionário, e do desconhecimento quase que total da variação, na língua oral, decorrente da diversidade cultural e geográfica. Segundo Bagno, alguns fenômenos lingüísticos como a palatalização, por exemplo, alterariam os conceitos de fala normal, engraçada, feia e/ou errada e, por sua vez, colocariam em questão, não somente a língua, mas também o se usuário, defendendo que as classes sociais a que essas pessoas pertencem são marginalizadas e desprestigiadas, e por isso a língua que falam sofre o mesmo preconceito. Corroborando com Bagno, Marcuschi assevera ser mais um mito o fato de considerar-se que pessoas sem instrução falam tudo errado; pois, mesmo pessoas ditas “iletradas”, estão sob a influência de estratégias da escrita em seu desempenho lingüístico. A perspectiva variacionista apresentada por Marcuschi defende que a variação se daria tanto na fala como na escrita, o que evitaria o equívoco de identificar a língua escrita como padronizada, pois não existem sociedades letradas, mas sim grupos letrados que detêm o poder social, já que as sociedades não são fenômenos homogêneos e globais, apresentando diferenças internas, em outras palavras, não existem línguas uniformes, todas elas variam.O quinto mito trata do tema: "O certo é falar assim porque se escreve assim", refletindo sobre a supervalorização da língua escrita em detrimento da língua falada, tendo como uma das conseqüências mais sérias o ensino de uma língua falada "artificial". Nele Bagno admite que "é necessária uma ortografia única para toda a língua, de modo que todos possam ler e compreender o que está escrito". Entretanto, a língua escrita é apenas uma tentativa de representação da língua falada e, como tal, possui limitações. Assim sendo, a manifestação escrita da língua tem limitações diversas, obedecendo a diferentes funções e a especificidades muito próprias, o que torna o seu ensino um desafio. A manifestação desse mito concretiza uma situação histórica: a confusão existente entre língua e gramática normativa, isso denuncia, segundo Bagno, a presença de mecanismos ideológicos agindo através da imposição de normas gramaticais conservadoras no ensino da língua. No mito “O certo é falar assim porque se escreve assim”, Bagno fala sobre a tendência no ensino da língua de se querer obrigar o aluno a pronunciar as palavras do mesmo modo que elas são escritas e que algumas gramáticas e livros didáticos aconselham o professor a “corrigir” os usuários de variações como “muleque”, “bejo”, “bisôro”. Segundo Bagno, trata-se de uma supervalorização da escrita combinada ao desprezo da língua falada, preconceito este que data de antes de Cristo. Essa supervalorização também é citada por Marcuschi que lembrando Stubbs (1980) afiança que a fala tem uma grande precedência sobre a escrita, embora a escrita seja vista como mais prestigiosa que a fala para algumas culturas. Marcuschi acrescenta, ainda, que a supervalorização da escrita leva a uma posição de supremacia das culturas com escrita ou até mesmo dos grupos que dominam a escrita dentro de uma sociedade desigualmente desenvolvida, separando-se deste modo as culturas civilizadas das primitivas. Os autores também compartilham a visão de que a oralidade é um fator de identidade social, regional e grupal dos indivíduos, visto que é possível uma palavra como “colégio” ser pronunciado distintamente por um pernambucano e por um paulistano. De acordo com Bagno, essa diferença se trata de uma variação e mostra que nenhuma língua é falada do mesmo modo por todos os seus falantes. Ainda no sexto mito, Bagno lembra que a escrita é uma tentativa exaustiva de representação da fala e que nenhuma palavra escrita terá a mesma força se ela for pronunciada com todas as inflexões. Mais uma vez os autores partilham do mesmo pensamento, pois Marcuschi lembra que a escrita não pode ser tida como uma representação da fala além de a escrita não reproduzir muitos dos fenômenos da oralidade, tais como a prosódia, a gestualidade, entre outros; apesar de, segundo Marcuschi, a escrita apresentar elementos significativos próprios, tais como o tamanho e o tipo de letras, cores e formatos.O mito de número sete "É preciso saber gramática para falar e escrever bem", aborda uma das mais delicadas questões do ensino da língua: a existência das gramáticas, que teriam como finalidade primeira a descrição do funcionamento da língua, mas que fatalmente se tornaram, no decorrer dos tempos, instrumentos ideológicos de poder e controle social.Finalizando o primeiro capítulo de sua obra, Bagno desmitifica a idéia de que “O domínio da norma culta é um instrumento de ascensão social” complementando o primeiro mito citado no livro, uma vez que ambos têm uma conotação social, pois estariam ligados aos poderes político e econômico. Segundo o autor, o fato de o indivíduo adquirir a norma culta da língua em nada contribui para que ele “suba na vida”, afinal de contas, que diferença isso faz na vida de uma criança que não tem uma casa decente para morar, nem as condições mínimas de sobrevivência a um ser humano?Por sua vez, no que tange a esse assunto, Marcuschi cita algumas questões, também bastante míticas, relativas à alfabetização (entendida aqui como uma prática dicotômica ao letramento). O autor diz que “a escrita, após se tornar um fenômeno de massa e desejável a todos os seres humanos, passou a receber um status bastante singular no contexto das atividades cognitivas de um modo geral”. Para muitos, o seu domínio se tornou um passaporte para a civilização e para o conhecimento. Mais do que ninguém, nós, professores de português, com nossos salários injustos, sabemos que, realmente, todo esse discurso não passa de um mito. Afinal, como bem disse Bagno, se o domínio da norma culta fosse “um instrumento de ascensão na sociedade, os professores ocupariam o topo da pirâmide social, econômica e política do país”.Com o título de "O círculo vicioso do preconceito lingüístico", Bagno alerta o leitor, no segundo capítulo, para a existência de determinados elementos (denominados "comandos paragramaticais"), que unidos funcionariam eficazmente na manutenção do círculo vicioso do preconceito. Alerta para o fato de que nomes de gramáticos conceituados no país estariam, de certa forma, fortalecendo a existência desse preconceito lingüístico, em contrapartida lingüistas e sociolingüistas através de trabalhos científicos com a língua, estariam desmitificando esse mesmo preconceito.Ao finalizar seu livro com um terceiro capítulo, cujo título é: "A desconstrução do preconceito lingüístico", Bagno reconhece a existência de uma crise no ensino da língua portuguesa, sugerindo alternativas de mudança de atitude, inclusive questionando a noção de "erro" e apresentando problemas considerados básicos por ele que manteriam a norma culta, como um "bem reservado a poucas pessoas no Brasil" devido a razões políticas, econômicas, sociais e culturais. Segundo o autor, deveríamos nos impor como falantes competentes de nossa língua materna, e, enquanto professores de língua, não poderíamos alimentar a manutenção de dogmas. Dessa forma, seríamos conduzidos a refletir sobre a língua e a produzir conhecimento gramatical. Através de atitudes como essas, a linguagem deixaria de ser o "poderoso instrumento de ocultação da verdade, manipulação do outro, de controle, de intimidação, de opressão, de emudecimento". Ao mesmo tempo em que Bagno taxionomiza a mitologia do preconceito lingüístico, descortina a possibilidade de combatê-la. As pessoas quando pensam que falam e escrevem "errado" sua língua estão naturalizando uma idéia preconcebida e, em conseqüência disso, aceitam passivamente sua estigmatização social, alimentando um processo que impede a reflexão e a conseqüente mudança do comportamento lingüístico.No trabalho de Bagno, além de o leitor encontrar um discurso marcadamente político, assumido pelo próprio autor no início do livro, percebe-se claramente uma profunda preocupação com os rumos do ensino da língua materna em iguais proporções às tecidas por Marcuschi em seu texto. Considerando os objetivos do autor ao produzir o livro, e a intenção de torná-lo um instrumento de combate ao preconceito lingüístico, não se pode deixar de recomendar sua divulgação junto aos meios acadêmicos, tanto em nível de terceiro grau como em nível de pós-graduação, em áreas cujo foco é o ensino/aprendizagem de língua materna. Aliando suas informações ao estudo de outros pesquisadores, como o fizemos neste trabalho poderemos de fato comprovar que, com base na lingüística - sozinha -, não será possível transformar o mundo em que vivemos, compreendendo que, com base nesta ciência, podemos avalizar a dependência, o menosprezo para com as formas de falar, pensar e sentir das classes mais oprimidas; ou lutar para a criação de condições científico-políticas que concorram para a libertação da consciência e da palavra dos povos e setores oprimidos da sociedade à qual pertencemos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico - o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 1999.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2000.

sábado, 8 de setembro de 2007

O LIVRO COMO MERCADORIA

No mercado, o livro participa de uma cadeia bastante diversificada de produtos chamados culturais e, de um tempo para cá, parece ter desistido de competir com os meios eletrônicos e com as linguagens não-verbais, para com eles fazer todo tipo de aliança: temos o livro musical, o livro-jogo, o livro de imagens, o livro brinquedo... disposto, na livraria ou no supermercado, ao lado de fitas de vídeo, de chocolate, de sorvete, etc. Não há como negar que no grande mercado que está do lado de fora da escola tem havido um conjunto de iniciativas voltadas à educação de um leitor já habituado ao cinema e à televisão. Nessa busca, a estratégia parece ser a da aliança.
E aos poucos, parece que certo segmento da sociedade, com poder aquisitivo, escolarizado, que já é, por exemplo, leitor de jornais e revistas, está se colocando não só perante a discussão em torno do livro, mas também está participando de forma mais intensa desse mercado. Nos dias de hoje, indo à videolocadora pode-se ganhar este ou aquele livro na locação de "x" fitas. Nas bancas de jornal, comprando-se a Folha de SP em certos dias da semana, leva-se por algum pequeno valor a mais, um livro-brinde, em geral um clássico de nossa literatura (que, inclusive eu, já comprei). Na imagem da campanha que habita o próprio jornal, projeta-se o leitor pretendido: o jovem (homem) bem-sucedido que, habituado a um veículo, digamos mais ligeiro, pode converter-se em leitor de algo mais refinado, como parece desejar o jornal. Ao lado de tais campanhas, em que o livro é vendido na compra de outro produto, surgem aqui e ali as livrarias que também oferecem brinquedos, revistas, café, CDs, etc.
Paulo Freire, sabiamente, nos ensinou que: “Mulheres e homens, somos os únicos seres que, social e historicamente, nos tornamos capazes de apreender”. E para apreender, não se pode entender o livro, como não se pode entender qualquer traço cultural, desvinculado de um contexto. Numa sociedade fechada pautada em valores absolutistas indiscutíveis, o livro é um repositório da verdade; o professor ‘’dá o livro’’ e na prova ‘’cobra o livro’. Já numa sociedade que está em processo de busca, o conteúdo do livro é uma referência que se leva em consideração. Ele apresenta uma verdade que deve ser discutida pelo professor e com os alunos.
Hoje, o fácil acesso à informação impressa (como citei acima), abre espaço para que se coloque em discussão a informação, para que se compare, questione, critique, crie e se conclua.
Acredito, que o mundo da escrita, do livro e da literatura, mundo de traços pretos, seqüência de linhas imóveis sobre páginas brancas, que se oferece ao leitor em silêncio e fixidez, que espera, pede e talvez exija um corpo solitário, parado, sentado, silencioso, concentrado, disposto a, do alto e da esquerda, perseguir e a animar blocos de linhas para produzir sentidos, é difícil para os alunos. Este mundo que tem sido porto seguro, para nós que nos consideramos leitores, é matéria de nossa imaginação e de nossas indagações sobre o outro mundo (o fragmentado, o dissipado, o da oralidade, o das imagens e sons em movimento, o da realidade eletrônica e eletrizante, o da cultura de massa, o da mídia) é um mundo familiar e ao mesmo tempo estranho para os alunos, acostumados com o outro mundo.
Na escola, o aluno deve dispor do livro especificamente o didático, o paradidático, o cientifico, etc.; mas deve também dispor dos recursos audiovisuais e dos multimeios em geral, como o “blog”, longe de acabarem com o livro, podem lhe dar outra dimensão. Assim, o livro redimensionado e enriquecido pelas mais modernas tecnologias, se mantém como valioso instrumento.
Mas para isso, é imprescindível efetuarmos uma leitura que nos estimule cada vez mais em face dos resultados que ela oferece. Pois, se nós, professores, pretendemos acompanhar a evolução do mundo, nos manter em dia, atualizados e bem informados, nós precisamos nos preocupar com a qualidade de nossa leitura, bem como com a qualidade da leitura que oferecemos aos nossos alunos, assim poderemos contribuir com uma influência positiva para nossos alunos, ensinando-os a ler, de forma crítica e reflexiva, não só dos textos que lhes interessarem, bem como os textos didáticos que lhes apresentarmos em sala de aula.


* Texto originalmente publicado em: Destaque IN - Revista Cultural de Sacramento e Região, Sacramento - MG, p. 32 - 33, 01 dez. 2006.
Disponível em: <http://destaquein.sacrahome.net/node/483>
. Publicado também no site Amigos do Livro. Disponível em: <http://www.amigosdolivro.com.br/lermais_materias.php?cd_materias=3758>

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

A EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES

A política de inclusão, na rede regular de ensino, dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, não consiste somente na permanência física desses alunos na escola; mas no propósito de rever concepções e paradigmas, respeitando e valorizando a diversidade desses alunos, exigindo assim, que a escola crie espaços inclusivos. Dessa forma, a inclusão significa que não é o aluno que se molda ou se adapta à escola, mas a escola consciente de sua função que se coloca a disposição do aluno.
As escolas inclusivas devem reconhecer e responder às diversas dificuldades de seus alunos, acomodando os diferentes estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando uma educação de qualidade para todos mediante currículos apropriados, modificações organizacionais, estratégias de ensino, recursos e parcerias com a comunidade. A inclusão, na perspectiva de um ensino de qualidade para todos, exige da escola novos posicionamentos que implicam num esforço de atualização e reestruturação das condições atuais, para que o ensino se modernize e para que os professores se aperfeiçoem, adequando as ações pedagógicas à diversidade dos aprendizes.
Deste modo, pode-se dizer que a escola inclusiva é aquela que acomoda todos os seus alunos independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais ou lingüísticas. Seu principal desafio é desenvolver uma pedagogia centrada no aluno, e que seja capaz de educar e incluir além dos alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, aqueles que apresentam dificuldades temporárias ou permanentes na escola, os que estejam repetindo anos escolares, os que sejam forçados a trabalhar, os que vivem nas ruas, os que vivem em extrema pobreza, os que são vítimas de abusos e até mesmo os que apresentam altas habilidades como a superdotação, uma vez que a inclusão não se aplica apenas aos alunos que apresentam alguma deficiência.
Para incluir a escola precisa, primeiramente, acreditar no princípio de que todas as crianças podem aprender e que todas devem ter acesso igualitário a um currículo básico, diversificado e uma educação de qualidade. As adaptações curriculares constituem as possibilidades educacionais de atuar frente às dificuldades de aprendizagem dos alunos e têm como objetivo subsidiar a ação dos professores. Constituem num conjunto de modificações que se realizam nos objetivos, conteúdos, critérios, procedimentos de avaliações, atividades e metodologias para atender as diferenças individuais dos alunos.
Assim sendo, é preciso desenvolver uma rede de apoio (constituída por alunos, pais, professores, diretores, psicólogos, terapeutas, pedagogos e supervisores) para discutir e resolver problemas, trocar idéias, métodos, técnicas e atividades, com a finalidade de ajudar não somente aos alunos, mas aos professores para que possam ser bem sucedidos em seus papéis.
A realização das ações pedagógicas inclusivas requer uma percepção do sistema escolar como um todo unificado, em vez de estruturas paralelas, separadas como uma para alunos regulares e outra para alunos com deficiência ou necessidades especiais.
Os educadores devem estar dispostos a romper com paradigmas e manterem-se em constantes mudanças educacionais progressivas criando escolas inclusivas e de qualidades.
Essas estratégias para a ação pedagógica no cotidiano escolar inclusivo são necessárias para que a escola responda não somente aos alunos que nela buscam saberes, mas aos desafios que são atribuídos no cumprimento da função formativa e de inclusão, num processo democrático, reconhecendo e valorizando a diversidade, como um elemento enriquecedor do processo de ensino e aprendizagem. Portanto, incluir e garantir uma educação de qualidade para todos os alunos é uma questão de justiça e equidade social. A inclusão implica na reformulação de políticas educacionais e de implementação de projetos educacionais inclusivo, sendo o maior desafio estender a inclusão a um maior número de escolas, facilitando incluir todos os indivíduos em uma sociedade na qual a diversidade está se tornando mais norma do que exceção.
Por isso é preciso refletir sobre a formação dos educadores, uma vez que ela não é para preparar alguém para a diversidade, mas para a inclusão; porque a inclusão não traz respostas prontas, não é uma “multi” habilitação para atender a todas as dificuldades possíveis na sala de aula, mas uma formação na qual o educador olhará seu aluno de um outro modo, tendo assim acesso as peculiaridades dele, entendendo e buscando o apoio necessário.
Por fim, cabe refletirmos sobre que é ser igual ou diferente? Pois, se olharmos em nossa volta, perceberemos que não existe ninguém igual, na natureza, no pensamento, nos comportamentos e/ou ações; e que as diferenças não são sinônimos de incapacidade ou doença, mas de equidade humana.
*Texto originalmente publicado no e-talk do site SBS Livraria Internacional. Disponível em:
O ofício do professor

Novas correntes propõem que a educação deve ser um processo de construção de aprendizagens no qual devemos formar cidadãos críticos, conscientes e ativos na sociedade. Esse conceito bonito é, por vezes, utópico, uma vez que sabemos que a instituição “escola” enfrenta diversos problemas em várias instâncias.
A realidade nos traz, durante o pleno exercício da profissão, problemas como preconceito social e racial, medo, drogas, marginalidade e até mesmo a burocracia que submete os professores à hierarquia de poder, e conseqüentemente, tolhe sua vontade e condição de desempenhar um papel comprometido com a formação de indivíduos críticos, ativos e autônomos.
Sabe-se que é através do domínio efetivo da língua, que o indivíduo se torna capaz de observar, estabelecer comparações, concluir, transformar, opinar e participar. Mas sem a comunicação o indivíduo não existe, não ocupa lugar na sociedade e, por conseguinte não usufrui seu direito de ser. Cabe, então, aos professores dar aos alunos a oportunidade de escolher, conscientemente, sua forma de existência.
Como não se educa para algo no qual não se acredita, é necessário repensar nosso compromisso enquanto educadores para não sermos meros “professores-padrão” tolhidos pela burocracia educacional e para que, realmente, sejamos de grande valia aos nossos alunos.
Assim sendo, devemos vivenciar, refletir e construir, paulatinamente, a cidadania de nossos educandos com paciência, dedicação e exemplo, sendo tanto o professor quanto o ambiente escolar modelos nos quais os alunos possam se apoiar durante esse processo de construção.
Ponderando que é indispensável a inserção cultural do aluno na leitura por ele realizada, e visando o alcance dos objetivos propostos pelos PCNs, como professores, devemos, portanto, nortear nosso trabalho por meio de textos autênticos e significativos, ensinando aos alunos que importa além do que o que o texto diz, a maneira como ele diz.
Além das disciplinas básicas, há os temas transversais como os direitos e deveres de um cidadão que precisam e devem ser ensinados através de sua vivência dentro do espaço escolar e mais especificamente dentro da sala de aula. Precisamos, portanto, redirecionar todos os nossos esforços, voltá-los para a descoberta de novas maneiras que nos permitam fazer de nossos alunos competentes usuários da língua.
Para concluir, posso asseverar que há algumas atitudes que podem e devem ser acrescentadas à prática de professores, dentre elas: a prática da reflexão e da auto-avaliação profissional; a realização de um trabalho coletivo nas escolas, a fim de que se trace o seu projeto de ensino; o conhecimento dos pais e/ou a comunidade quanto ao trabalho que se propõe. É preciso, ainda, que se contornem as dificuldades materiais presentes nas escolas para possibilitar ao aluno que se torne sujeito de sua aprendizagem e do seu discurso. Diante disso, a escola precisa sair da artificialidade das aulas, em busca de situações reais de interlocução, que permitam ao aluno dizer a sua palavra.
O ESTUDO E A APRENDIZAGEM


O ser humano pode aprender pela reflexão. Esta é, aliás, uma forma tipicamente humana de aprender. Já que a educação tem compromisso com o aprimoramento da pessoa, deve favorecer esta forma de aprendizagem – forma que permite a utilização das amplas potencialidades intelectuais humanas, que garante resultados mais duradouros e profundos, além de possibilitar maior compreensão da realidade e melhoria no nível das relações interpessoais.
O grande educador Jean Piaget afirmou que: ‘’O direito à educação (...) não é apenas o direito de freqüentar escolas: é também, na medida em que vise a educação ao pleno desenvolvimento da personalidade, o direito de encontrar nessas escolas tudo aquilo que seja necessário à construção de um raciocínio pronto e de uma consciência moral desperta.’’
Piaget é muito otimista quanto à aprendizagem. Como Dewey, pensa que aprender é próprio do organismo; chega a ser condição de sobrevivência do organismo. Já estará fazendo muito o educador que não atrapalhar essa tendência natural do indivíduo para aprender querendo facilitar, mas é preciso entender que a facilitação reside no estímulo ao desenvolvimento da inteligência, já que, na verdade, o desenvolvimento intelectual é um processo de contínuas aprendizagens.
Ensinar não deve ser entendido de outro modo senão o da criação de condições para o desenvolvimento intelectual. O caminho a ser seguido pelo professor é o de fornecer estímulos que alimentem as estruturas mentais existentes e apresentar situações problemas que provoquem o progresso mental.
Diz Piaget: ‘’ Compreender é inventar ou reinventar, e dar uma lição prematuramente é impedir a criança de encontrar ou redescobrir as soluções por si mesma’’. Refletindo sobre esse assunto, cada dia tenho mais certeza que precisamos, enquanto educadores, no efetivo exercício da profissão dar-lhes esta chance. Hoje está suficientemente comprovado que o desafio é o processo didático para o desenvolvimento intelectual, portanto, ensinar é apenas desafiar, adequada e gradualmente nossos alunos. Se a função da escola pode ser resumida, de certa forma, nos seguintes termos: espera-se que o aluno aprenda e que o professor oriente a aprendizagem do aluno. Questiono, então: Mas aprender o quê? Estudar o quê? Aprender conceitos e princípios, atitudes, valores, hábitos e habilidades? Estudar conceitos e teorias sem significado contextual para eles? Os professores sempre mandam os alunos estudarem. Mas será que alguma vez esses professores disseram aos seus alunos o que é estudar, ou como estudar? Penso que seja fundamental que o professor desenvolva boas habilidades de estudo para dar boas aulas e orientar seus alunos no estudo.
Segundo Madalena Gomide estudo é ‘’a experiência submetida à análise e ao pensamento reflexivo do indivíduo que aprende’’. Para ela o estudo requer concentração mental, captação de sensações e relações associativas, planejamento individual de horário, leitura eficiente, organização de resumos, aumento de vocabulário, saber tomar nota em aula, memorização, busca de informações e organização de trabalhos.
Em seu livro Aprendendo a Estudar, Madalena, afirma que para maior rendimento no estudo é necessário: organizar um plano diário ou semanal, ser assíduo às aulas, estudar em local adequado, utilizar as técnicas de leitura, anotação e seleção de documentação. Precisamos desenvolver essas técnicas em nossa própria vida, e quem sabe, seremos capazes de ensinar através do nosso exemplo, caso contrário, não teremos “moral” para cobrar deles que estudem de forma eficiente e realmente aprendam tudo o que o programa objetiva ensinar.

* Artigo publicado no site Brasil Escola. Disponível em: <http://meuartigo.brasilescola.com/educacao/o-estudo-aprendizagem.htm>

LUDICIDADE NA SALA DE RECURSOS

Patrícia Ferreira Bianchini Borges
Vanessa de Carvalho Prudente Araújo
Escola Municipal Adolfo Bezerra de Menezes


A brincadeira tem papel predominante na aprendizagem exploratória, integrando o pensamento intuitivo, permitindo a ação motivadora no potencial do ser humano para que ele possa saber buscar soluções necessárias. O brincar, o jogar, segundo Piaget (1982) e Vygotsky (1987) - pesquisadores que são referência no assunto na área pedagógica - ajudam no desenvolvimento físico, intelectual reforçando os vínculos afetivos do ser humano com o próximo. Para Santin e Luckesi (2000) atividades lúdicas são aquelas que propiciam uma experiência de plenitude, não definíveis por palavras, mas compreendidas pela fruição, povoadas pela fantasia, pela imaginação e pelos sonhos que se articulam como teias urdidas com materiais simbólicos. Como bem observa Fortuna (2001), em uma sala de aula ludicamente inspirada, convive-se com a aleatoriedade, com o imponderável; o professor renuncia à centralização, à onisciência e ao controle onipotente e reconhece a importância de o aluno ter postura ativa nas situações de ensino, sendo sujeito de sua aprendizagem. As brincadeiras criam espaços virtuais para a experimentação construtiva, inovadora e permanente no processo interventivo. São, além disso, de vital importância no processo ensino-aprendizagem uma vez que trazem vantagens afetivas como: redução da ansiedade e melhora da autoconfiança. Fundamentadas em diversos objetivos educativos utilizamos as brincadeiras não só para encorajar nossos alunos a trabalhar mantendo seu interesse, como também, para criar contextos, nos quais o conhecimento a adquirir seja-lhes útil e significativo. Buscamos, por meio de diversos jogos, ampliar, gradativamente, as possibilidades de comunicação, expressão e o desenvolvimento do raciocínio lógico dos educandos, garantindo-lhes o sucesso escolar através da superação das dificuldades de aprendizagem. Brincadeiras, jogos, ludicidade são, portanto, atividades utilizadas no processo de construção de aprendizagens das crianças na Sala de Recursos da Escola Municipal Adolfo Bezerra de Menezes, que desenvolve um trabalho pautado numa proposta metodológica que visa o prazer lúdico-recreativo e a liberdade de expressão. Conhecendo ou não os espaços aonde chegam e as pessoas com quem estão, os educandos criam momentos lúdicos, instituem novos grupos e neles se comunicam numa linguagem comum a todos: a divisão. Na Sala de Recursos, a brincadeira tornou-se um meio de construção prazerosa do conhecimento, encorajadora do trabalho dos alunos, pois leva a criar, interpretar e questionar o mundo que os cerca, transformando a escola num ambiente dinâmico, de interação social, cultural e desenvolvedor dos potenciais: psicomotor, intelectual e criativo. A ludicidade tornou-se indispensável, pois colabora na apreensão de conhecimentos artísticos e estéticos, bem como para a integração dos sujeitos, possibilitando a ampliação da percepção, da imaginação e dos sentimentos; levando-os a desenvolver aspectos significativos da personalidade, a capacidade de conviver, de aceitar e, principalmente, respeitar o outro. Assim, as vivências lúdicas na Sala de Recursos transformaram-se numa maneira de nossos alunos experimentarem situações em que o fazer se identifique com o brincar e o imaginar, usando a linguagem e a representação, formando um todo em interação: educandos/educadores; além de proporcionar realizações que despertam o prazer e o entusiasmo, contribuem significativamente para o desenvolvimento da cognição, da linguagem, da área motora e da área social das crianças.

Palavras-chave: sala de recursos, ludicidade, construção do conhecimento

Referências Bibliográficas

FORTUNA, Tânia Ramos. Formando professores na Universidade para brincar. In: SANTOS, Santa Marli P.dos (org.). A ludicidade como ciência. Petrópolis: Vozes, 2001, p.116.
PIAGET, Jean. O nascimento da inteligência da criança. 4 ed.. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
VIGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
LUCKESI, Cipriano Carlos (org.) Ludopedagogia - Ensaios 1: Educação e Ludicidade. Salvador: Gepel, 2000.


* Pôster publicado originalmente no XII Congresso Regional de Educadores de Uberaba e do Triangulo Mineiro, 2006. Uberaba. Anais Escola: Caminhos e Desafios. Uberaba: Secretaria Municipal de Educação e Cultura, 2006. p. 60-61.

sábado, 1 de setembro de 2007

ESCOLA X JUVENTUDE

“A finalidade de nossa escola é ensinar a repensar o pensamento,
a ‘desaber’ o sabido e a duvidar de sua própria dúvida;
esta é a única maneira de começar a acreditar em alguma coisa.”
Juan de Mairena


“A educação deve ser um processo de construção de aprendizagens em que formamos cidadãos críticos, conscientes, ativos e criativos na sociedade” - conceito bonito e, por vezes, utópico, já que sabemos que a instituição “escola” enfrenta diversos problemas em várias instâncias.
A realidade nos traz, durante o pleno exercício da profissão, problemas como preconceito social e racial, medo, drogas, marginalidade e até mesmo a burocracia que submete professores à hierarquia de poder, e conseqüentemente, tolhe sua vontade e condição de desempenhar um papel comprometido com a formação de indivíduos críticos, ativos e autônomos.
Sabemos que é através do domínio efetivo da língua, que o indivíduo se torna capaz de observar, estabelecer comparações, concluir, transformar, opinar e participar. Mas, sem a comunicação o indivíduo não existe, não ocupa lugar na sociedade e, por conseguinte não usufrui seu direito de ser. Cabe aos professores, dar aos alunos a oportunidade de escolher, conscientemente, sua forma de existência.
Impossível, nesse quadro, deixar de pensar na escola: Que papel deve ela cumprir na formação do jovem? Como prepará-lo para os desafios dos novos tempos? Como prepará-lo para a vida, se o futuro, como diz Morin, chama-se "incerteza"?
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM), aprovadas em 1998, são uma resposta possível a essas questões. A LDB inova ao colocar o Ensino Médio como parte da educação básica, afirmando a necessidade de universalização desse nível de ensino. Inova também ao separar o ensino profissionalizante: ao assegurar terminalidade, o Ensino Médio deve oferecer formação geral, ficando a profissionalização para cursos concomitantes ou posteriores ao Ensino Médio. E inova, por fim, ao propor flexibilidade na organização curricular, nas formas de pensar o tempo na escola e a trajetória escolar do aluno.
O jovem tem expectativas bastante sensatas em relação à escola, espera sentir-se parte dela e poder dela se orgulhar. Para isso, quer que ela tenha uma "cara própria" e que lhe ofereça canais de participação, além da oportunidade de se envolver em questões que digam respeito a ele mesmo e a sua comunidade, como as relacionadas à saúde (sexualidade, drogas), meio ambiente e qualidade de vida.
Como espaço de aprender a ser e de aprender a conviver, a escola é também um espaço onde o jovem pode e deve exercitar o protagonismo, atuando efetivamente nela, apresentado propostas, promovendo discussões que digam respeito à vida escolar ou ao interesse da comunidade, participando de organizações como grêmios ou outros grupos de seu interesse - teatro, dança, banda ou jornal - capazes de contribuir para a construção ou o fortalecimento da identidade da escola.
Apesar de todos os problemas, a escola ainda se mostra um espaço atraente para adolescentes e jovens pela possibilidade do encontro com outros jovens. Os corredores, pátios e outras dependências transformam-se em espaços privilegiados de convivência, e por isso mesmo, são considerados interessantes. Algumas escolas reconhecem a importância dessa convivência e procuram favorecê-la fazendo com que adolescentes e jovens se apropriem do espaço escolar e reforcem os laços de identificação com a escola.
Junto com seus iguais, longe do controle dos adultos, consumindo ou produzindo cultura, os jovens e adolescentes podem manifestar suas dúvidas, angústias, trocar conhecimentos, realizar desejos, experimentar comportamentos e atitudes, elaborando suas identidades e seus modos de se relacionar com o mundo.
Situando-se na mediação entre o espaço público e o privado e tendo o foco de sua ação na construção e socialização de conhecimentos, valores e atitudes, a escola tem a possibilidade de ajudar o aluno a fazer uma tradução crítica das vivências que traz, mostrando-lhe novas possibilidades de leitura, tanto de si e quanto do mundo, tornando-se, assim, uma referência para eles. Pela importância socialmente atribuída à escola, pela peculiaridade de seu papel, pelo tempo em que adolescentes e jovens nela permanecem; ela tem grande potencial para tornar-se um espaço em que esses alunos vejam suas questões, dúvidas, angústias e descobertas acolhidas e trabalhadas de forma a ampliar o campo no qual constroem suas identidades e projetos. Reconhecer como legítimas as experiências que eles vivenciam, nos mais diversos espaços, torna-se condição para que o conhecimento escolar tenha sentido.
A escola pode, ainda, interferir positivamente junto aos jovens, no que se refere ao comportamento de risco e à transgressão, próprios dessa fase, para assumir firmemente seu papel em questões como a prevenção do uso das drogas; mas para tanto, a escola precisa ter a tranqüilidade necessária à compreensão de qualquer problema e jamais estigmatizar os alunos que porventura façam esse uso.
O convívio com a diferença, propiciado pela escola, é importante, também, para a percepção de que ser diferente não é problema é peculiaridade da espécie humana; cabe, portanto, à escola não rotular o aluno como fraco e sim como diferente. Esse convívio contribui, ao mesmo tempo, para percepção de que não é necessário ser sempre do mesmo modo: as pessoas mudam, constroem novos valores, assumem novas atitudes, desenvolvem novas relações. As diferenças representam, ainda, a possibilidade de se enxergar no outro e poder afirmar com clareza: “sou assim, sinto assim, manifesto meus sentimentos assim e penso assim; ele é diferente de mim, pensa de outro modo, sente e manifesta seus sentimentos de outro modo.”
A escola proporciona momentos de reflexão de qualidade distinta daquela exercida em outros âmbitos; pode, também, contribuir para que percebam e reflitam sobre diferentes projetos propondo como foco de sua influência a ampliação e a problematização das escolhas possíveis; pode, inclusive, ser reconhecida pelos alunos como um espaço que acolhe suas questões e contribui para encontrem respostas para seus questionamentos.
A escola precisa, portanto, ser acolhedora; estruturar-se de maneira viva, dinâmica estimulando os alunos a se manifestar, a organizar atividades que favoreçam o convívio extra classe; favorecer a ação autônoma e a participação em instâncias da gestão escolar; proporcionar e incentivar uma comunicação intensa e livre, para trabalhar na perspectiva do diálogo com os estudantes tendo como referência as culturas juvenis das quais participam, visando o desenvolvimento de suas capacidades, a ampliação e o enriquecimento dos referenciais para a construção de identidades e projetos de que dispõem, seja no tratamento das áreas e temas transversais, seja no convívio social que possibilita aos seus alunos e professores.
Desta forma a escola poderá cumprir seu papel principal: propiciar a formação da “consciência crítica” necessária aos alunos para que eles conquistem não só o letramento exigido dentro dela, como também aqueles que surgem e se desenvolvem fora dela, não menos importantes no seu processo de formação pessoal.

* Artigo publicado no site Brasil Escola. Disponível em: <http://meuartigo.brasilescola.com/educacao/escola-x-juventude.htm>

ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS: OLHANDO PARA O FUTURO


As discussões sobre a importância de se aprender uma língua estrangeira remonta há vários séculos. Assim, em determinados períodos da história do ensino de idiomas, privilegiou-se o conhecimento do latim, do grego e/ou do conseqüente acesso à literatura clássica; enquanto que em outros momentos valorizou-se o estudo das línguas visando ora alguns objetivos específicos, ora outros, desconsiderando-se, portanto a competência lingüística que deveria ser o objetivo maior a ser alcançado.
Deste modo, ao pensarmos na aprendizagem de uma segunda língua, é imperativo ponderar os verdadeiros motivos pelos quais queremos aprendê-la para obter sucesso. Evidentemente, é fundamental atentar para a realidade das necessidades, motivações e desmotivações, como: as semelhanças e diferenças entre as várias culturas, a constatação de que os fatos sempre ocorrem dentro de um determinado contexto, a aproximação das situações de aprendizagem à realidade pessoal e cotidiana dos estudantes, entre outros fatores que auxiliam ou atrapalham o processo de construção de conhecimentos.
Desta forma, se em lugar de pensarmos, unicamente, nas habilidades lingüísticas, pensarmos em competências a serem dominadas, talvez seja possível estabelecermos as razões que de fato justificam essa aprendizagem.
Nessa linha de pensamento, deixa de ter sentido o ensino de línguas que almeja apenas o conhecimento metalingüístico e o domínio consciente de regras gramaticais que permitem, quando muito, alcançar resultados simplesmente medianos em exames escritos. Esse tipo de ensino, que acaba por tornar-se uma simples repetição, ano após ano, dos mesmos conteúdos, cede lugar, na perspectiva atual, a uma modalidade de aprendizagem significativa que tem como princípio geral levar o aluno a comunicar-se de maneira adequada em diferentes situações da vida cotidiana.
Nesta perspectiva, encontramos no âmbito da LDB, as Línguas Estrangeiras Modernas recuperando, de alguma forma, a importância que durante muito tempo lhes foi negada. Consideradas, muitas vezes e de maneira injustificada, como disciplina pouco relevante, elas adquirem, agora, a configuração de disciplina tão importante como qualquer outra do currículo, do ponto de vista da formação do indivíduo. Assim, integradas à área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, assumem a condição de serem parte indissolúvel do conjunto de conhecimentos essenciais que permitem ao estudante aproximar-se de várias culturas e, conseqüentemente, propiciam sua integração num mundo globalizado.
É essencial, pois, entender-se a presença das Línguas Estrangeiras Modernas inseridas numa área, e não mais como uma disciplina isolada no currículo, pois as relações que se estabelecem entre as diversas formas de expressão e de acesso ao conhecimento justificam essa junção.
Assim o esforço de pensar o ensino-aprendizagem de uma língua, implica a existência de reflexões, significações e re-significações que nos levam em direção a uma aprendizagem significativa, uma vez que não nos comunicamos apenas através de palavras; os gestos também dizem muito sobre a forma de pensar das pessoas, assim como as tradições e a cultura de um povo esclarecem muitos aspectos da sua forma de ver o mundo e de aproximar-se dele.
Por um século inteiro, entre 1880 e 1980, educadores buscaram um método ideal de ensino de Língua Estrangeira. Foram criadas diversas correntes de ensino, como a de gramática e tradução, a audiovisual, a audiolingual, entre outras; mas os especialistas concluíram que o método não poderia ser visto como um modelo pronto e definido.
Parafraseando Alba Celani “para se contemplar o futuro, torna-se imperativo olhar para o passado, e isso só é possível a partir do presente.” Dessa observação surgem questões como: “Qual o panorama, atual, do ensino de línguas? Quais as tendências dominantes? Para onde apontam?”.
Nas décadas de 1970 e início de 80, era comum ensinar e aplicar exercícios específicos para cada uma das áreas isoladamente, equivalentes às quatro principais habilidades no ensino de línguas estrangeiras: “ouvir, falar, ler e escrever”. Professores em treinamento, por vezes, recebiam a seguinte instrução: “Não se deve falar nada antes de ouvir, não se deve ler nada antes de falar, não se deve escrever nada antes de se ler”.
A partir da década de 80, esse conceito passou a ser revisto e o que antes era tratado como método virou um processo dinâmico, cíclico, cheio de incertezas e sem fim. Recursos múltiplos, oferecidos por diferentes tipos de mídia, passaram a ter papel relevante no ensino de línguas estrangeiras, uma vez que atualmente, há varias ferramentas para o processo ensino-aprendizagem de línguas dantes inexistentes, dentre elas o uso da tecnologia que encoraja o ativo aprendizado, auxiliando os estudantes a pesquisar, a acessar informações, etc.
O grande desafio para nós, professores, na caminhada em direção ao futuro do ensino de línguas estrangeiras seria aprender a lidar com as mudanças e de acordo com a realidade vivida pelos alunos, suas expectativas e perspectivas; ensinando-lhes conteúdos significativos, posteriormente aproveitáveis e levando-os a reconhecer que a aquisição de uma segunda língua é parte integrante da formação global do indivíduo, pois permite o acesso aos bens culturais da humanidade.


Referência:

CELANI, Maria Antonieta Alba. Ensino de Línguas Estrangeiras: Olhando para o Futuro. In: Ensino de Segunda Língua: Redescobrindo as Origens. Org. Maria Antonieta Alba Celani. São Paulo: EDUC, 1997.

POR QUE OS PROFESSORES REALIZAM O ENSINO DA FORMA QUE REALIZAM?


Vivemos num contexto histórico-cultural em que o professor deve estar em contato permanente com as questões contemporâneas relacionadas à sua ação e também ao processo de ensino-aprendizagem. De um modo geral, os problemas relacionados ao ensino de Português revelam que vários fatores de ordem social, econômica e política acabam por interferir diretamente na ação dos professores em sala de aula.
Problemas que vão desde a escassez do material básico (livros, xerox, papel e até mesmo o ultrapassado estêncil), passando pela instabilidade no trabalho e esbarrando, finalmente, na falta de uma política permanente e consistente de Ensino, que contribua para uma formação que assegure aos professores uma mudança da sua prática em sala de aula.
Nesse sentido, Kramer (1990), quando discute a questão da formação continuada, argumenta contra os "pacotes de treinamento", baseados na concepção do "efeito multiplicador" ou "efeito de repasse", que supostamente se daria através de instâncias intermediárias (especialistas que tentam repassar conhecimentos aos professores). De acordo com Kramer, muitos desses encontros pedagógicos revelam-se superficiais sendo, portanto, insuficientes para produzir novas atitudes docentes.
É preciso reconhecer que a formação inicial dos professores atuais não é suficiente para levá-los a criar, questionar, criticar, refletir, porque durante muito tempo receberam os manuais com as "receitas" e o modo de como empregá-las. Uma das maiores queixas dos professores é que eles não conhecem livros didáticos que atendam às exigências do Programa Curricular Mínimo de Língua Portuguesa e dos PCNs, e que não dispõem de tempo para procurar ou elaborar outras atividades em torno do material de que dispõem.
A formação contínua representa, atualmente, a possibilidade que o professor em exercício tem de aprimorar as suas práticas desenvolvidas em sala de aula. De acordo com Marques (1992), a formação continuada "significa possibilitar a articulação entre a atuação do professor na sala de aula e o espaço para reflexão coletiva, e o aperfeiçoamento constante de práticas educativas, refundando-as sempre de novo na produção do saber / competências requeridas".
Para Perrenoud (2000), construir ou reconstruir o currículo da formação de professores para favorecer a mudança na escola significa navegar entre o realismo conservador e o otimismo ingênuo, procurando a distância ideal entre a formação e as condições efetivas da prática. Para ele, se a distância for pequena, a formação contribuirá para reproduzir o funcionamento e, conseqüentemente, as disfunções e injustiças do sistema. Se for grande, terá os mesmos efeitos, ainda que seja acompanhada de um sentimento de desilusão, de insucesso, de uma depressão ou de uma fuga para outra profissão.
Mas os problemas do ensino de Português não residem somente na formação inicial ou continuada, eles vão além. Há que se considerar, ainda, a rotatividade de professores, a falta de recursos didáticos e do material básico em algumas escolas. Não basta formar bons professores, se os salários e as condições gerais de trabalho inviabilizam qualquer esforço de atualização.
Diante do exposto acima, percebe-se que a questão da formação do professor de língua materna precisa ser redimensionada. O ensino de gramática, em alguns casos, passou do uso da frase descontextualizada à "gramática no texto", que nada mais tem sido, na prática, que a gramática exercitada a partir de trechos de textos literários, do aluno ou da imprensa. Com isso, a leitura está perdendo cada vez mais o seu espaço na aula, uma vez que este está sendo utilizado para ler-se o texto de forma rápida e, imediatamente, após se passar ao trabalho “textual”, que, em vez de “completar e classificar conjunções” identifica e classifica “operadores argumentativos” em poemas, propagandas, tirinhas, ou, ainda, que em vez de “completar frases com o pronome certo”, propõe aos alunos “ver os pronomes que têm no texto”, após a leitura da letra de uma música ou de uma reportagem (Kleiman, 1999:67).
Torna-se necessário, portanto, redirecionar os esforços, voltá-los para a descoberta de novas maneiras que permitam fazer de nossos alunos competentes usuários da língua. Para concluir, pode-se afirmar que há algumas atitudes que podem e devem ser acrescentadas à prática de professores, dentre elas: a prática da reflexão e da auto-avaliação profissional; a realização de um trabalho coletivo nas escolas, a fim de que se trace o seu projeto para o ensino de português; o conhecimento dos pais e/ou a comunidade quanto ao trabalho que se propõe. É preciso, ainda, que se contornem as dificuldades materiais presentes nas escolas para possibilitar ao aluno que ele se torne sujeito de sua aprendizagem e do seu discurso. Diante disso, a escola precisa sair da artificialidade nas aulas de Português, em busca de situações reais de interlocução, que permitam ao aluno dizer a sua palavra.


Referências:

KLEIMAN, Angela & MORAES, Silvia. Leitura e interdisciplinaridade. Campinas: Mercado de Letras, 1999.
PERRENOUD, Philippe. Pedagogia diferenciada: das intenções à ação. Porto Alegra: ArtMed, 2000.
A APROPRIAÇÃO DA LINGUAGEM NA CONSTRUÇÃO DA ESCOLA CIDADÃ


Passados mais de cem anos do surgimento, crescimento e afirmação da Lingüística moderna como ciência autônoma, muitos continuam a dar as costas à investigação científica da linguagem, preferindo consagrar-se à divulgação e sustentação das "superstições, mitos e estereótipos" que circulam em nossa sociedade há anos.
Não obstante às tentativas dos escritores românticos de criar um português brasileiro, a iniciativa só foi bem sucedida com o Modernismo a partir de 1922. Esse movimento artístico foi o início do processo de independência cultural e lingüística do Brasil em relação a Portugal. Com o experimentalismo da primeira geração modernista, o lusitanismo (como padrão lingüístico) estava fora de cogitação, era uma tentativa de inserir na literatura a linguagem coloquial do brasileiro. Portanto, essa questão de ter um português brasileiro não é nova e não está encerrada, sendo revalorizada quando se abordam os estudos da língua e se considera o ponto de vista da sociolingüística.
No final da década de 60, a tese de que a Lingüística substituiria, rápida e eficazmente, a Gramática e a Filologia, assim como, a de que a Lingüística era um meio de se fundamentar cientificamente o estudo das obras literárias instituindo um fator de renovação do ensino da língua materna, eram defendidas com entusiasmo. A Lingüística parecia, então, impor-se às demais ciências humanas, como ciência capaz de revelar as matrizes de todo comportamento significativo.
Em 1990, o lingüista e educador britânico, Michael Stubbs, já escrevia que "toda a área da língua na educação está impregnada de superstições, mitos e estereótipos, muitos dos quais têm persistido por séculos e, às vezes, com distorções deliberadas dos fatos lingüísticos e pedagógicos por parte da mídia".
Nos dias atuais, os direitos lingüísticos que têm sido atribuídos à norma de prestígio, denominada "culta", são negados aos idiomas originais e às formas populares da linguagem. Essa é a evidência de uma política lingüística e educacional em grande medida discriminadora, racista. Naturalizou-se na escola, por exemplo, que para aprender a escrever, as crianças têm de mudar de dialeto, o que equivale a escrever desconsiderando-se a própria cultura e história. Quebra-se, desse modo, a ponte entre oralidade social de origem e escrita; situação que contribui para o enfraquecimento dos esteios identitários.
Assim, a noção de Lingüística, tornou-se vaga por abranger uma série muito grande de disciplinas e orientações metodológicas; e sua aplicação no ensino não foi suficientemente ampla, nem eficaz, para surtir os espetaculares resultados que se esperavam.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), em seu volume dedicado ao ensino da língua portuguesa, propõem que levemos aos alunos a imagem de uma língua única, mais próxima da modalidade escrita da linguagem, subjacente às prescrições normativas da gramática escolar, dos manuais e mesmo dos programas de difusão da mídia sobre “o que se deve e o que não se deve falar e escrever”.
O referido documento é enfático ao afirmar que há muitos preconceitos decorrentes do valor social relativo que é atribuído aos diferentes modos de falar: é muito comum se considerar as variedades lingüísticas de menor prestígio como inferiores ou erradas; portanto, o problema do preconceito disseminado na sociedade em relação às falas dialetais deve ser enfrentado, na escola, como parte de um objetivo educacional mais amplo: “o da educação para o respeito à diferença”. Sendo referência para a reorientação curricular, os PCNs constituem o eixo norteador da política educacional, por isso são abertos e flexíveis, assegurando o respeito à diversidade cultural do país e às adaptações que integram as diferentes dimensões da prática educacional.
Essas crenças, segundo o lingüista e educador Marcos Bagno (2001), produziram uma prática de mutilação cultural que, além de desvalorizar a forma de falar do aluno, tratando sua comunidade como se fosse formada por incapazes, denota desconhecimento de que a escrita de uma língua não corresponde inteiramente a nenhum de seus dialetos - por mais prestígio que um deles tenha em um dado momento histórico.
O realismo lingüístico é indispensável ao professor para ensinar a seus alunos que a língua e a gramática são como elas são e não como pretendem impô-las; que não há língua que não evolua; que os usos e os fatos devem prevalecer sobre preconceitos normativos; e, sobretudo ensinar que a língua é um saber interior e pessoal dos falantes, da qual o ensino deve partir e sempre se basear.
Em sua trajetória, Bagno (2001) combate abertamente a manutenção das concepções arcaicas e preconceituosas de língua, asseverando que devemos ensinar a norma-padrão na escola; pois, só se pode ensinar algo que o aprendiz ainda não conhece. Cabe à escola, portanto, ensinar a norma-padrão, que não é língua materna, nem dialeto, nem variedade. E ensinar o padrão se justificaria, pelo fato de que ele tem valores que não podem ser negados em sua estreita associação com a escrita, já que “é o repositório dos conhecimentos acumulados ao longo da história”. Esses conhecimentos, assim armazenados, constituiriam a cultura mais valorizada e prestigiada, de que todos os falantes devem se apoderar para se integrar de pleno direito na produção, na condução e na transformação da sociedade em que estão inseridos.
Possenti (1996) e Rocha (2002) reforçam esse julgamento e defendem que o papel da escola é ensinar a língua padrão, em outras palavras, o de criar condições para que ela seja ensinada considerando que esta pode ser uma ferramenta valiosa para compreender a linguagem humana numa perspectiva não exclusivamente discursiva, textual ou pragmática.
Magda Soares (1986) nos ensina que “um ensino de língua materna comprometido com a luta contra as desigualdades sociais e econômicas reconhece, no quadro dessas relações entre a escola e a sociedade, o direito que têm as camadas populares de apropriar-se do dialeto de prestígio, e fixa-se como objetivo levar os alunos pertencentes a essas camadas a dominá-lo, não para que se adaptem às exigências de uma sociedade que divide e discrimina, mas para que adquiram um instrumento fundamental para a participação política e a luta contra as desigualdades sociais.” Visto que não é necessário, ao aluno/cidadão, conhecer a nomenclatura nem as definições propostas pelas gramáticas tradicionais. Esse aluno precisa sim, é que a escola seja um lugar que cuide, aborde e trabalhe a realidade cotidiana na qual estão inseridos; precisa sim, é de uma escola que os ensine a participar da política e a lutar contra as desigualdades sociais; precisa sim, é de uma escola “cidadã”. Portanto, ser capaz de identificar, por meio de uma terminologia, o "sujeito" e o "predicado" de uma frase, não faz nenhum sentido para eles; o que importa é o que a frase quer dizer, os efeitos de sentido que ela pode provocar, o que ela tem a ver com a realidade deles...
O Prof. Ataliba T. de Castilho (1998) - considerado o nome mais importante da pesquisa científica sobre o português brasileiro contemporâneo - escreve que: “os recortes lingüísticos devem ilustrar as variedades sócio-culturais da Língua Portuguesa, sem discriminações contra a fala vernácula do aluno, isto é, sua fala familiar. A escola é o primeiro contato do cidadão com o Estado, e seria bom que ela não se assemelhasse a um ‘bicho estranho’, a um lugar onde se cuida de coisas fora da realidade cotidiana. Com o tempo o aluno entenderá que para cada situação se requer uma variedade lingüística, e será assim iniciado no padrão culto, caso já não o tenha trazido de casa”. Desse modo, prossegue o autor, “a gramática deixará de ser vista pelos alunos como a disciplina do certo e do errado, reassumindo sua verdadeira dimensão, que é a de esquadrinhar através dos materiais lingüísticos o funcionamento da mente humana”.
Afinal, o que aconteceu, ao longo dos séculos, segundo Castilho, foi que a gramática, que não era uma disciplina autônoma, assumiu na escola uma vida própria, desgarrada de suas origens, e concentrada apenas na sentença, na palavra e no som, obscurecendo-se sua argumentação e empobrecendo-se seu alcance. Se existe, porém, uma grande resistência contra o redimensionamento do lugar do ensino da gramática na escola é porque sabemos que, ao longo do tempo, o conhecimento mecânico da doutrina gramatical se transformou num instrumento de discriminação e de exclusão social.
Pode-se acrescentar que há esforços no sentido de que o padrão seja complexo e difícil de aprender justamente para evitar que as classes populares, menos escolarizadas, venham a dominá-lo com facilidade, atenuando assim seus estigmas de inferioridade. "Saber português", na verdade, sempre significou "saber gramática", isto é, ser capaz de identificar - por meio de uma terminologia falha e incoerente - o "sujeito" e o "predicado" de uma frase, pouco importando o que essa frase queria dizer ou os efeitos de sentido que podia provocar.
Sabe-se que a Lingüística não deve ser aplicada ao ensino da língua materna na forma de uma teoria particular e que há idéias sobre as quais se deve haver um consenso entre os lingüistas de diferentes formações, com vistas a criar um conjunto de orientações potencialmente capazes de alterar os hábitos e conceitos em relação à língua materna. Assim sendo, teóricos e educadores empenhados num conhecimento maior e melhor da realidade lingüística do nosso país, não devem se basear exclusivamente na arcaica doutrina gramatical normativo-prescritiva, cuja inconsistência teórica e cujos problemas epistemológicos graves vêm sendo demonstrados e criticados pela Lingüística moderna desde o final do século XIX.
No ensino de língua portuguesa, não há Pedagogia, Psicologia, Metodologia e/ou Fonoaudiologia que substitua o conhecimento lingüístico que o professor deve ter. Sem uma base lingüística verdadeira, as pessoas envolvidas em questões de ensino de português acabam acatando velhas e erradas tradições de ensino ou se apoiando explícita ou implicitamente em concepções inadequadas da linguagem.
Seria interessante que a polêmica se tornasse mais conhecida e chegasse à escola, aos meios de comunicação e aos cidadãos cultos em geral, que, a rigor, desconhecem solenemente, em mais de um sentido, um dos lados da controvérsia quem sabe assim poder-se-ia combater o excessivo conservadorismo; defender que a chamada norma culta é mais imaginária que real; analisar afirmações conservadoras na mídia sobre "língua correta" e as avaliar com critérios das teorias variacionistas; reivindicar de forma coerente uma gramática para os brasileiros; mostrar que o português ao qual dizem que são devotados não é o que eles mesmos praticam e mostrar que as línguas mudam e assim, mudam-se os padrões.
Entendo que esta poderia ser uma ferramenta valiosa - junto a outras, é óbvio - para compreender a linguagem humana desde uma perspectiva não exclusivamente discursiva, textual ou pragmática; e que indagando os processos de identidade lingüísticas e educacionais, tendo presentes rostos, vozes, histórias de tantas vidas cujo destino está em risco - não só lingüístico - conceberíamos uma teoria nada mais do que como forma de compreender o mundo. Bem dizia Marx que além de compreendê-lo, o que importa de verdade é transformá-lo.
E se de fato comprovar-se que, com base na lingüística - sozinha -, não será possível transformar o mundo no qual vivemos, também compreender-se-á que, com base nesta ciência, podemos avalizar a dependência, o menosprezo para com as formas de falar, pensar e sentir das classes mais oprimidas; ou lutar para contribuir para a criação de condições científico-políticas que concorram para a libertação da consciência e da palavra dos povos e setores oprimidos da sociedade à qual pertencemos.


Referências:

BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 2001.
____________ Português ou Brasileiro? Um convite à pesquisa. São Paulo: Parábola Editorial, 2001.
____________, STUBBS, Michael & GAGNÉ, Gilles. Língua Materna: letramento, variação & ensino. São Paulo: Parábola, 2002.
BRASIL/ MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais. 1996.
CASTILHO, Ataliba T. de. A língua falada e o ensino de português. São Paulo: Contexto; 6a. ed., 2004.
POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: Mercado das Letras, 1997.
ROCHA, Luiz Carlos de Assis. Gramática: Nunca Mais - O Ensino da Língua Padrão sem o Estudo da Gramática. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, 2002.
SOARES, Magda. Linguagem e Escola; uma perspectiva social. São Paulo: Ática, 1986.

A LITERATURA: UM “FIO DE ARIADNE” NO LABIRINTO DO ENSINO

A literatura, o teatro e o cinema são escolas de vida para crianças
e adolescentes, onde eles aprendem a se reconhecer a si mesmos.
[...] escolas de complexidade humana onde se descobrem a
multiplicidade interior de cada ser e as transformações das
personalidades envolvidas na torrente dos acontecimentos.
Edgar Morin (1997)


Não é recente a relação da escola, e em especial da disciplina de língua portuguesa com a literatura. Essa relação quer no Ensino Fundamental, quer no Ensino Médio, vem se desenvolvendo não só ao sabor de uma tradição, mas também das mudanças educacionais e sociais através das tentativas de inovação pedagógica.
A dificuldade de ensinar literatura na escola, talvez se encontre no engano de perspectiva ao se lidar com uma obra literária: não se sabe distinguir a palavra-informação da palavra-arte. Enquanto a primeira é essencialmente denotativa, quanto mais preciso e unívoco seu significado, melhor cumprirá sua função: levar o maior número possível de pessoas a entender do mesmo modo a informação; com a segunda, sendo conotativa, dá-se o contrário, porque possibilita múltiplas interpretações, já que é uma palavra poética.
Deste modo, lidamos com a palavra-arte como se ela fosse palavra-informação. Trabalhamos, na escola, com a literatura do mesmo modo que com a matemática ou a geografia: não distinguimos objetivos, nem empregamos estratégias diferentes para essas espécies de palavras.
Os estudos literários nas escolas brasileiras, que tinham como eixo as características de cada período, escola ou movimento, ditavam a seleção dos excertos modelares, por conseguinte textos e/ou autores que não servissem de exemplificação de tais características eram sumariamente descartados, priorizando-se a história da literatura, esquecemos da leitura e de que junto a ela, fora das salas de aula, deve estar o prazer, a fruição, as emoções e o diálogo verdadeiro com a palavra-arte.
Em termos gerais, pode-se afirmar que prevaleceu até pouco tempo uma formação em literatura que - iniciando-se no ginásio com autores como Vieira, Machado, Graciliano, entre outros - prosseguia do mesmo modo até o final do Ensino Médio. A "Antologia Oficial" era firme na tentativa de construção de um letramento literário apoiado, exclusivamente, num conjunto de obras e autores, que assegurasse o conhecimento da nossa própria história cultural.
A partir dos anos 80, inicia-se um período de vigência de outros modelos e o trabalho da literatura na escola começou a ganhar outro contorno. Em formação desde meados da década anterior, a literatura infanto-juvenil chega com força às escolas e às aulas de língua portuguesa, produzindo-se outros padrões de literatura escolar, dentre eles os romances de enigma, de suspense, de terror, de aventura e de amor.
Necessitamos contemplar a atual prescrição oficial, ao mesmo tempo oferecer um espaço de reflexão crítica e de discussão da língua e da literatura tratando o texto como campo de pesquisa, definindo problemas elaborando estratégias de olhar, abordando diversas análises e a partir de então, tratar da fundamentação teórica sólida.
Sabendo-se que gostar ou não da literatura não é um dado biológico, de nascença, mas, sim, uma característica da história de cada um; cabe aos educadores, portanto, influir o máximo possível nesse dado cultural. Com base nessa realidade, dúvidas surgem: É lícito impor-lhe a literatura? Até que ponto é legítimo determinar a leitura de uma obra a ser cobrada em determinado dia do calendário escolar? Seria a técnica da coerção capaz de formar leitores?
É preciso mostrar ao aluno não só a literatura, mas também as demais artes como fascinantes formas de descoberta do indivíduo, nas relações de recreação e recriação possíveis entre ele e a obra, descortinando todas as possibilidades de cada arte, mas, contudo, deixando-o livre para se aventurar nos caminhos de uma ou de outra. Cabe ao educador sempre se questionar se está atuando de forma eficiente e orientadora, se está motivando verdadeiramente e/ou se está oferecendo um acompanhamento estimulante ao aluno para que sinta prazer em ler um clássico da literatura.
Cyana Leahy, professora da UFF, considera que o ideal seria trabalhar de acordo com uma proposta teórico-metodológica de educação literária - educar pela literatura - compatível com as políticas públicas para a educação escolar no que elas têm de mais adequado. Embora a maioria dos programas elaborados por coordenadores falasse em despertar no aluno o prazer da literatura, em sua opinião a disciplina traduzia uma “mistura malfeita e desnecessária de português com história”, “perda de tempo”, “a melhor maneira de fazer alguém detestar ler” (alunos), portanto devemos lutar contra essa visão errônea da disciplina literária na escola.
Deste modo, a sala ambiente de língua portuguesa torna-se um espaço que visa reunir e integrar as diferentes linguagens, expressando as tradições humanas que coexistem fora da escola, inserindo o aluno à leitura realizada de textos autênticos e significativos e levando-o a concluir que “importa além do que o texto diz, a maneira como ele diz”.



Referências:

BARROS, Maria de Fátima. BRAGA, Regina Maria. Construindo o leitor competente – Atividades de leitura interativa para a sala de aula. Editora Fundação Peirópolis, 2002.
PAULINO, Graça. COSSON, Rildo. Leitura literária: a mediação escolar. Faculdade de Letras da UFMG, 2004.




A LEITURA E A CONSTRUÇÃO DO LEITOR EM POTENCIAL


Ah, como é importante para a formação de qualquer criança ouvir muitas, muitas histórias... Escutá-las é o início da aprendizagem para ser um leitor, e ser leitor é ter um caminho absolutamente infinito de descoberta e de compreensão do mundo...
Fanny Abramovich



A leitura é um dos grandes, senão o maior, elemento da civilização. De acordo com Bakthin, o ato de ler é um processo abrangente e complexo de compreensão e intelecção do mundo que envolve uma característica essencial e singular ao homem: a sua capacidade simbólica de interagir com o outro pela manifestação da palavra. (BRANDÃO:1997).
Com base na concepção de Bakthin, pode-se afirmar que ler não é unicamente decodificar os símbolos gráficos, é também interpretar o mundo em que vivemos. É, ao mesmo tempo, uma atividade ampla e livre, embora não seja uma prática neutra, visto que no contato de um leitor com um texto estão envolvidas questões culturais, políticas, históricas e sociais, presentes nas várias formas de tradição. Deste modo, quando lemos, associamos as informações lidas à grande bagagem de conhecimentos armazenados em nosso cérebro e, naturalmente, somos capazes de interpretar, criar, imaginar e sonhar.
Para que isso aconteça, é necessário que haja maturidade para a compreensão do material lido, senão tudo cairá no esquecimento ou ficará em nossa memória sem uso, até que tenhamos condições cognitivas para utilizá-lo.
A leitura representa, para o leitor, a ponte entre o mundo lingüístico e o mundo real; e o convívio com a literatura permite ao homem desvelar novos propósitos de reflexão e uma apuração estética que aguça as preferências por determinadas opções de leitura.
Bom leitor, no entanto, é aquele que lê fazendo observações, analisando e aprofundando-se nas idéias apresentadas pelo autor do texto, compreendendo e construindo mentalmente sua síntese ou resumo e; que ao mesmo tempo, aperfeiçoa seus conhecimentos acerca do vocabulário, das variações semânticas das palavras, do sentido denotativo e conotativo das expressões de nossa língua empregando-os, posteriormente, na construção de um texto gramaticalmente correto.
Segundo ZILBERMAN (1987) é a posse dos códigos de leitura que muda o status da criança e a integra num universo maior de signos, o que nem a simples audição ou o deciframento das imagens visuais permitem. Apesar dos obstáculos em torno da construção do leitor em potencial - tais como a falta de acesso a livros pelas camadas populares, ou mesmo a presença constante da televisão em nossas vidas (sem exigir quaisquer esforços do recebedor) - é imprescindível sua existência e poder para a formação da consciência crítica do indivíduo-leitor.
Por que criar o hábito de ler? Questiona-se, então. De acordo com a consultora Maria José Nóbrega, de São Paulo, além de ser uma forma de entretenimento e lazer, a leitura é também uma forma de adquirir conhecimentos em qualquer área: "Lendo também nos mantemos atualizados sobre assuntos do nosso bairro, da nossa cidade, do nosso país" afirma ela.
Corroborando, CUNHA (1994) afirma que a leitura é uma forma altamente ativa de lazer. Em vez de propiciar, sobretudo, repouso e alienação, como ocorrem em formas passivas de lazer, a leitura exige não só um grau maior de consciência e atenção como também uma participação efetiva do recebedor-leitor.
Na atualidade, cabe principalmente à escola o papel de mostrar o valor da leitura e o deleite que um bom texto pode proporcionar. Entretanto, a família e a sociedade, na mesma proporção, devem assumir a tarefa de desenvolver nas crianças formas ativas de lazer – que as tornem indivíduos críticos e criativos tanto quanto conscientes e produtivos.
Partindo desses pressupostos, retoma-se o sujeito - o aluno-leitor em potencial - e o objeto de estudo - o livro - como desencadeadores do estímulo à leitura, através de uma íntima relação entre o indivíduo e sua língua materna. E instigar esse leitor em potencial é investir em sua habilidade de mergulhar e envolver-se na magia e sabedoria dos livros que alimentam e embelezam.
Ouvir e/ou ler histórias é adentrar em um mundo encantado, cheio ou não de mistérios e surpresas, mas sempre muito interessante, curioso, que diverte e ensina. Por meio dessa relação lúdica e prazerosa, da criança com a obra literária, temos uma das possibilidades de formar alunos-leitores. Além disso, a exploração da fantasia e da imaginação instiga a criatividade e fortalece a interação entre o texto e o leitor. A literatura infantil não deve, portanto, ser utilizada apenas como um "pretexto" para o ensino da leitura e para o incentivo à formação do hábito de ler. Se a obra literária estabelecer relações entre teoria e prática, tornar-se-á um objeto mediador de aquisição de aprendizagens.
Sabendo-se que a leitura é um dos mais importantes meios de se chegar ao conhecimento, torna-se necessário aprender a ler, com profundidade e não em quantidade, visto que ler é dar sentido às palavras.
Assim, saber ler é o ponto de partida para dominar toda a riqueza que um texto (literário ou não) pode transmitir, por conseguinte, bom leitor é aquele que faz uma análise do texto lido, aprofundando-se na compreensão dos detalhes e construindo seu próprio entendimento sobre o que leu.
Para LAJOLO E ZILBERMAN (1996:311) “ao espessamento das práticas de leitura, ainda que intermitente e cheio de recuos, corresponde um amadurecimento do leitor que, na inevitável interação com os múltiplos elementos de práticas mais complexas de leitura, rompe restrições, libera-se da tutela, enfim, alcança a emancipação possível”.
A suposição de que não se lê, porque não se conhecem os segredos maravilhosos do mundo da leitura, porque não se tem o estímulo apropriado ou não se tomou o gosto pela leitura, não resiste à análise isenta e sincera. O que parece necessário - mais do que campanhas promocionais de prática de leitura - é indagar, sem pré-juízos, quem, o quê, como, em que condições e por que razões ou não se lê isto ou aquilo. Em outras palavras, trata-se de verificar que fatores sociais, políticos, econômicos e culturais promovem ou desfavorecem esta ou aquela leitura. Trata-se de abandonar a postura magistral de quem sabe o que outro deve ser ou fazer e permitir que aflorem as contradições, os interesses, os valores que corroboram para as práticas leitoras na sociedade contemporânea. Trata-se, enfim, de pôr em questão tanto as leituras quanto os discursos sobre leitura, permitindo que se manifestem as práticas veladas, desautorizadas e desconsideradas.
Partindo da idéia de que o acesso democrático ao material escrito é condição básica para o incentivo à leitura, a biblioteca pública e/ou escolar apresenta-se como um espaço de sua realização e deve ser compreendida como um direito do cidadão.
Na década de 50, ao definir a criança como seu público-alvo, Monteiro Lobato já se antecipava ao que se tornou a tônica internacional da promoção da leitura: a base sólida para se formar um adulto-leitor se constrói desde a infância, através do contato com histórias contadas por adultos, do contato com livros, sem moralismos, com variedade e qualidade de temas e que expressem respeito à criança e à sua inteligência.
A sua preocupação em fazer com que o livro estivesse próximo aos seus leitores o colocou à frente de seu tempo. Do mesmo modo se antecipou, quando apresentou o livro como um produto a ser oferecido onde o potencial leitor estivesse, facilitando seu acesso. E o fez, tanto diretamente na escola, como no comércio em geral, independente das livrarias.
Embora, nos dias atuais, se tenha mais acesso à palavra escrita do que antes - seja através da escola, dos produtos de consumo ou dos meios de comunicação - a ausência desse material escrito, no dia-a-dia das pessoas, na verdade, é o empecilho mais concreto para a construção de uma sociedade leitora. Portanto, pode-se concluir que ser leitor não é uma questão de opção, mas de oportunidade.
Parafraseando Alceu Amoroso Lima, é preciso que as crianças concebam a leitura como o mais movimentado, variado, engraçado e cativante dos mundos, e se entreguem ao encantamento proveniente da leitura de um livro e quiçá difundir-se-ão aos quatro ventos os admiráveis versos de Castro Alves em “O livro e a América”:


“Por isso na impaciência
Desta sede de saber,
Como as aves do deserto –
As almas buscam beber...
Oh! Bendito o que semeia
Livros... livros à mão cheia...
E manda o povo pensar!
O livro caindo n’alma
É germe – que faz a palma,
É chuva – que faz o mar.”


Referências:

ALVES, Castro. Espumas flutuantes. In: Poesias Completas. São Paulo: Ediouro, 1870.
BRANDÃO, H. e MICHELETTI, G. “Teoria e prática da leitura.” In: Chiappini, L. (coord. geral). Aprender e Ensinar com Textos Didáticos e Paradidáticos. São Paulo: Cortez, 1997, v.2.
CUNHA, Maria Antonieta Antunes. Literatura Infantil: Teoria e Prática. São Paulo; Ática, 1994.
LAJOLO Marisa & ZILBERMAN Regina. A formação da leitura no Brasil. São Paulo: Ática, 1996.
____________________________ A leitura rarefeita - livro e literatura no Brasil. São Paulo, Edit. Brasiliense, 1991.
ZILBERMAN, Regina. A Literatura Infantil na Escola. São Paulo: Global, 1987.
* Artigo publicado nos sites:
. Vestibular 1, em 16/07/2006. Disponível em: <www.vestibular1.com.br/revisao/leitura_construcao.doc>
. Traça - Livraria Sebo, em 31/01/2007. Disponível em: <http://www.traca.com.br/?pag=clip20070131>
. Blog da Livraria Osório (SEBO), em 02/02/2007. Disponível em: <http://blog.livronet.com.br/index.php?op=ViewArticle&articleId=132&blogId=1>
. Via6, em 05/04/2008. Disponível em: <http://www.via6.com/topico.php?tid=170341>
INTERDISCIPLINARIDADE: MUDANÇA DE CONCEPÇÃO NO ENSINO


Avaliando a problemática da relação aluno X professor X escola, Hamilton Werneck, afirma: ”Ensinamos demais e os alunos aprendem cada vez menos! Aprendem menos porque os assuntos são, a cada dia, mais desinteressantes”. O tom crítico, por ele usado, encerra com soluções construtivas, uma série de enfoques sempre abordados e dificilmente enfrentados por aqueles que se interessam pela educação, sua evolução e seus problemas correlatos.
Segundo Werneck (1998:12), a “Escola” é hoje uma instituição que não evolui e impede ao máximo quaisquer avanços. Impede até mesmo os atos do “Pensar”, pela ânsia de atingir os objetivos de “Repetir”, guardando em seus muros as cicatrizes da “Reação” e da “Conservação”.
Na tentativa de esclarecer o porquê de aprenderem cada vez menos, pode-se sugerir que os assuntos abordados pela escola são, muitas vezes, desinteressantes e desligados do contexto dos fatos, assim como os objetivos propostos afastam-se da realidade que vivenciam os alunos, automaticamente, são forçados a se debruçar sobre assuntos, complexos e desprovidos de sentido, revelando a quantidade absurda de “cultura inútil” que, literalmente, “enfia-se” em suas cabeças na escola.
Ao diferenciar a “Cabeça Bem-Feita” da “Cabeça Cheia”, Edgar Morin (2001:21) afirma que uma dispõe de princípios organizadores que permitem ligar os saberes e lhes dar sentido; enquanto a outra apenas acumula o saber, sem dispor de um princípio de seleção e organização que lhe dê sentido. Segundo ele, com a inclusão recente de novas disciplinas ao currículo tradicional - que já traduzia um conhecimento fragmentado - tende a ser cada vez mais compartimentado, necessitando de um policiamento maior nas suas fronteiras devido ao amontoado de informações na “cabeça cheia” dos estudantes.
Por se abordar tantas inutilidades, conseqüentemente, não há tempo para um aprofundamento qualitativo do ensino - o que, certamente, é mais importante para a formação e o amadurecimento de um indivíduo - e o aluno, forçado a memorizar grande quantidade de conteúdos, à medida que o tempo passar os esquecerá; e logo nenhum registro conservar-se-á em sua mente. Permanecerá, apenas, o método por ele, empregado na organização de um trabalho intelectual ou técnico - que continuará empregando para instruir-se, por conta própria, quando necessário - e não as informações que, simplesmente, foram memorizadas em determinado período, tais como listas de nomes de presidentes da república, nomes de rios e lagos ou mesmo complicadas fórmulas matemáticas, jamais são aplicáveis à vida prática.
Werneck (1998:20), após profunda análise crítica, constata que a “interdisciplinaridade” é a grande mola para a preparação da era pós-industrial. Considera, ainda, que a supressão dos compartimentos estanques - limitadores da ação do educador - deve ser o ponto de partida da ação pedagógica nas escolas. De modo que não há como negar, por exemplo, que se abordem assuntos políticos ou sociais na aula de literatura; ou ainda, que a ecologia não está ligada à geografia, à história ou à sociologia, uma vez que essas áreas constituem dimensões de um cidadão em contínua formação e aprimoramento.
A interdisciplinaridade e a democracia pedagógica são, então, consideradas elementos facilitadores na constante busca de conhecimentos e valores a serem transmitidos pela instituição escola. Propõe-se, portanto, uma mudança na concepção de ensino, que quebre essa estrutura secular, fundamentada no isolamento das disciplinas e orientadora do trabalho de muitos professores.
Ivani Fazenda (1996:14) constata que a palavra “interdisciplinaridade” é tida como palavra de ordem das propostas educacionais atuais - não só no Brasil como no mundo. Entretanto, é empregada quase que exclusivamente no discurso, pois os professores não sabem o que realmente devem fazer com ela, sentindo-se perplexos frente à possibilidade de sua implementação na educação, visto que estão habituados a currículos organizados pelas disciplinas tradicionais, mas assegura que “perceber-se interdisciplinar é o primeiro movimento em direção a um fazer interdisciplinar e a um pensar interdisciplinar”.
Fazenda (1996:17) acrescenta que num projeto interdisciplinar “não se ensina nem se aprende: vive-se, exerce-se”. De acordo com ela, a marca desse projeto é a responsabilidade individual, que está imbuída do envolvimento com o projeto em si, com as pessoas e com as instituições a ele pertencentes. E a atitude interdisciplinar é caracterizada pela “a ousadia da busca, da pesquisa: é a transformação da insegurança num exercício do pensar, num construir”.
Segundo Marcel Proust: “uma verdadeira viagem de descobrimento não é encontrar novas terras, mas ter um olhar novo”; Jacques Lebeyrie, completa: “quando não se encontra solução em uma disciplina, a solução vem de fora da disciplina”. Com base nessas afirmações, Edgar Morin (2001:107) reafirma a necessidade da ruptura entre as fronteiras disciplinares, da invasão de um problema de uma disciplina por outra, de circulação de conceitos, para conseqüentemente fazer progredir as ciências, em outras palavras, corrobora com a prática da interdisciplinaridade.
Outro conceito, abordado por Morin (2001:115), é a “metadisciplinaridade”. O termo “meta” significa ultrapassar e conservar. ”Não se pode demolir o que as disciplinas criaram, não se pode romper todo o fechamento; há o problema da disciplina, o problema da vida; é preciso que uma disciplina seja, ao mesmo tempo, aberta e fechada.” Considerando a citação de Juan de Mairena: ”a finalidade de nossa escola é ensinar a repensar o pensamento, a ‘des-saber’ o sabido e a duvidar de sua própria dúvida; pois esta é a única maneira de começar a acreditar em alguma coisa”, Morin (2001:21) propõe a construção de conhecimentos em vaivém, que progride indo das partes ao todo e do todo às partes, conservando conhecimentos importantes e ampliando-os significativamente.
Para concluir, poder-se-ia apropriar das magníficas palavras de Durkheim (1890:38) “re-afirmando” que o objetivo da educação não é o de transmitir conhecimentos sempre mais numerosos ao aluno, mas o “de criar nele um estado interior e profundo, uma espécie de polaridade de espírito que o oriente em um sentido definido, não apenas durante a infância, mas por toda a vida”.


Referências:

DURKHEIM, Emille. L’Évolution pédagogique em France. PUF, 1890.
FAZENDA, Ivani. Práticas Interdisciplinares na Escola. – 3ª ed. - Organização Ivani Fazenda. São Paulo: Ed. Cortez, 1996.
MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Tradução Eloá Jacobina. - 5ª ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
WERNECK, Hamilton. Ensinamos demais, Aprendemos de menos. – 14ª ed. - São Paulo: Ed. Vozes, 1998.
* Artigo publicado no site Vestibular 1, em 16/07/2006. Disponível em: <www.vestibular1.com.br/revisao/interdisciplinaridade.doc>